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O meu filho dava um livro...

... e vários filmes!!! Num elenco de luxo, temos como protagonista Salvador, nascido a 28.04.2010, em cenários da vida quotidiana. Registado no nosso dia-a-dia, por isso aconselha-se alguma prudência quando imaginar as cenas descritas: são bem reais..

O meu filho dava um livro...

... e vários filmes!!! Num elenco de luxo, temos como protagonista Salvador, nascido a 28.04.2010, em cenários da vida quotidiana. Registado no nosso dia-a-dia, por isso aconselha-se alguma prudência quando imaginar as cenas descritas: são bem reais..

Estava tudo a correr tão bem...

... a sério que estava: eu tinha conseguido comer a comida quentinha, jantado do principio ao fim sem me levantar (eu disse que um dia ia conseguir!!!)...

 

O Salvador estava a comer o segundo sozinho e eu estava a lavar a louça, quando ouço, em tom lacrimoso:

 

- Oooooooooooohhhhhhhh Mamãããããããããããã...

 

Virei-me em câmara lenta...

... Tão lenta que ainda vi o sumo de laranja a escorrer, em fio, do copo para cima dele.

 

Olhei em volta: sumo na mesa, na comida, na cadeira, no chão... nele. No pijama que lhe tinha vestido depois do banho, mesmo antes de nos sentarmos à mesa para jantar.

 

De imediato, pediu-me muitas desculpas e prometeu, sem eu abrir a boca, que se tinham acabado as brincadeiras às refeições.

 

- Foi um acidente, Filho, mas percebes agora por que é que a Mãe está sempre a dizer que não se brinca à mesa?

- Sim Mamã, desculpa-me... muito, sim?

- Sim, Filho.

 

Incrivelmente, consegui manter a calma, apesar do caos que se seguiu:

  • Despir o Salvador na cozinha;
  • Levá-lo para o quarto e dar-lhe banho... Outra vez;
  • Vestir-lhe pijama lavado e despachá-lo para a sala;
  • Limpar meia cozinha, mesa e cadeira e trocar a toalha de mesa;
  • Enfiar a roupa toda na máquina e pô-la a lavar;
  • Acabar de lavar a loiça;
  • Acabar de fazer a sopa;
  • Lavar o resto da loiça e limpar o fogão;
  • Chegar à sala e o jogo dos Angry Birds estar espalhado por todo o lado... Respirar fundo para não chorar;
  • Apanhar o jogo e avisar o Salvador que tem que ir dormir;
  • Respirar fundo para não chorar...;
  • Avisar o Salvador que se não der beijinho ao Pai, fica de castigo e não vai à piscina;
  • Levá-lo para o quarto;
  • Lavar-lhe os dentes e pô-lo a fazer chichi;
  • Deitá-lo e avisá-lo que não é para se levantar;
  • Fazer a minha cama e vestir o pijama;
  • Respirar fundo e....

... Sentar-me a escrever este texto enquanto faço tempo para que a máquina acabe de lavar a roupa para a ir estender.

 

A sério que estava tudo a correr tão bem:

  • Saí do emprego e apanhei o comboio;
  • Cheguei à estação, comprei  o passe e troquei dinheiro;
  • Apanhei o Salvador no colégio;
  • Cheguei a casa, descarreguei as mochilas e fui pagar à empregada;
  • Voltei para casa e desfiz as mochilas;
  • Arranjei as mochilas e a roupa do Salvador para amanhã;
  • Fiz a cama do Salvador;
  • Apanhei, dobrei e arrumei duas máquinas de roupa;
  • Despi o miúdo e experimentei-lhe a roupa de praia do colégio (Serve!!!, não vamos ter de comprar nada este ano!!!);
  • Dei banho ao miúdo;
  • Arrumei a louça e lavei a loiça do pequeno almoço;
  • Preparei o sumo de laranja e a sopa do Salvador;
  • Sentei-me a jantar e a dar jantar ao Salvador;
  • Fui lavar a loiça do jantar;
  • Interrompi a lavagem da loiça para levar o Salvador ao wc;
  • Trouxe o Salvador de volta à cozinha e sentei-o para que acabasse de jantar:
  • E depois...

... Foi o que puderam ler.

 

Agora... 

  • Agora são 22h47 e o Salvador acabou de entrar na sala;
  • Fui deitá-lo e ele pôs-se a chorar;
  • O Pai foi lá perceber o que se passava e explicar-lhe que é muito tarde e ele tem de dormir...

Entretanto...

... A máquina acabou de lavar: A roupa já está estendida e eu vou-me estender...

 

A sério que estava a correr bem.

E se continuasse a correr bem, eu agora estaria apenas rota ao invés de estar completamente.... podre.

Um dia...

... eu vou conseguir jantar sem uma cena destas:

 

- Mãe, hoje na escola doeu-me muito a barriga.

- E foste à casa de banho?

- Não, não tive vontade.

- E porque é que estás a falar nisso agora: Estamos à mesa, a jantar, e quando se está à mesa não se fala de casa de banho, está bem?

- Sim, Mãe.

- Muito bem.

- Mas Mãe...

- Sim, Filho?

- Mas dói-me a barriga.

- Salvador, isso não te desculpa: tens que jantar. Depois vamos os dois resolver isso.

- Como?

- Janta que depois vamos à casinha.

- Mãe?

- Sim?

- Mas dói-me o rabo...

- Dói-te o rabo?

- Sim.

- Oh, Filho....

- TENHO CÓCÓ PA SAIR!!!!

- Oh Meu Deus, vamos lá à casa de banho!!

 

Pelo caminho:

- Mãe, e vais dar-me a mão?

- Salvador, vais à sanita, não vais ter um filho!!! - digo exasperada!

- Quê??

- Nada, dou-te a mão até à casa de banho, depois ficas na sanita.

 

Sanita com ele.

Estava eu já prestes a desmaiar, quando ele se sai com esta:

- Mãe, isto vai cheirar mal.

- Ainda pior?

- Porquê?, já cheira mal?

- Esquece. 

- Mãe, isto vai cheirar mal. Podes ir pá sala qu'eu quando tiver despachado chama-te.

- Então vou para a cozinha.

- Fazer?

- Jantar, que era o que estávamos a fazer.

- Depois eu chamo-te.

- Está bem.

 

Dez segundos depois, estava eu a tirar o garfo da boca após a primeira garfada e ouve-se:

- MÃÃÃÃÃÃEEEEEE!!

- Sim, Filho??

- JÁ ESTÁ!!!

 

Já nem consegui acabar de jantar....

 

Um dia eu vou conseguir jantar, sentada do principio ao fim, comer a refeição toda ainda quente.

Um dia eu vou conseguir fazê-lo sem me levantar quinhentas vezes, sendo que uma delas é sempre para fazer de dama de companhia na casa de banho... 

 

Um dia eu vou conseguir... Até lá, vou aproveitando a «dieta»! ;)

À terceira foi de vez!

Estranhei ele não mencionar nada em todo o caminho para casa e, por isso, mal chegámos, perguntei:

 

- E então Salvador, usaste a escova de dentes nova do Faísca?

- Não.

- Como não, hoje não lavaste os dentes na escola?

- Não.

- Não? Mas não porquê?

- Porque hoje não é dia de lavar os dentes.

- Todos os dias são dias de lavar os dentes, seja aqui seja na escola.

- Não é não!!! Na escola só se lava os dentes um dia.

- Ah é!?!?!? E quando é esse dia???

- Não é hoje, é.... a sexta-feira!

- Não acredito que hoje não lavaste os dentes!!

- Não, é só à sexta!!

- Nem lavaste com a pasta nova que a Mãe mandou??

- Qual pasta?

- A das riscas!!

- Mostra-me onde está!! - e ia procurá-la na mochila, quando lhe barrei o caminho.

- Está na escola; com a escova do Faísca.

 

Baixei-me e olhei-o nos olhos:

- Diz a verdade à Mãe: lavaste os dentes na escola ou não?

- Não.

- Salvador!?!?!? 

- NÃO LAVEI!!!

- Muito bem, amanhã pergunto à Marina.

 

Deixei cair o assunto.

Quando lhe fui dar banho voltei à carga:

- Então e que tal foi lavar os dentes hoje na escola?

- Já disse-te eu hoje não lavei os dentes.

- Ah, pois foi. Esqueci-me. E porque é que não lavaste os dentes, relembra-me lá.

- Porque hoje é sexta-feira e nas sextas-feiras não se lavam os dentes...

- Não, hoje é segunda-feira, e como já te disse, todos os dias são dias de lavar os dentes.

- Não é assim na escola.

- Amanhã pergunto à Marina, Salvador!

- Mas não lavei!!!

- Então e o que aconteceu à escova do Faísca e à pasta nova?

- Num sei!!!

 

A conversa estava a azedar.

Mas, «filho de peixe, peixinho é»: para teimoso, teimosa e meia!!

Deixei cair esta segunda tentativa, mas não me fiquei por aqui...

 

Quando lhe estava a lavar os dentes antes de o deitar, fiz a derradeira tentativa:

- Amanhã vou perguntar o que aconteceu à escova e pasta nova que te mandei para a escola...

- Desapareceram, Mãe?

- Não sei, diz-me tu.

- Eu? Digo o quê?

- Lavaste os dentes na escola?

- Não.

- Vou perguntar só mais uma vez e não me mintas que é muito feio: Hoje lavaste os dentes na escola?

- Eu não lavei com a escova nova; lavei com a vela.

- Com uma vela?

- Com a vaca.

- Qual vaca??

- Como é que se diz que não é nova?

- Com a escova velha?!?!?

- Isso!!!

 

 

Chiça, estava difícil... 

Ao jantar

- Porque é que vocês podem comer os pãos todos e eu não?

- Os pães - responde o Pai - Os pães.

- Os pães?

- Sim: 1 pão; dois pães - explica o Pai.

- É como o cão, Filho: 1 cão, 2.... Diz tu - incentivo-o eu.

- Dois cães!

- Isso! Agora que já percebeste, diz tu um exemplo sozinho - peço-lhe eu.

- Está bem: 1 papagaio, 2.... papagães!!!

 

E desatámo-nos os 3 a rir!!!

Ler aos 4 anos

O Salvador gostava muito de saber ler. E para ele, ler é em voz alta.

 

Este verão estávamos na praia quando ele me perguntou:

- O que é que o Tio António está a fazer?

- Está a ler uma revista.

- Não está nada!!!

- Está sim, faz pouco barulho e deixa o Tio António a ler descansado.

- Mas eu não estou a ouvir nada; ele não está a ler.

- Está sim. Está a ler para ele e, quando fazemos assim, não lemos em voz alta.

- Ah... É ler de boca fechada?

- É mais ou menos isso.

 

 

Esta tarde:

- Mãe, preciso do papel do Furby!!!

- Mas para quê?

- Para ver lá uma coisa!!!

- Para ver o quê?

- Uma coisa!!! Preciso mesmo do papel!!! Anda buscar!

- Eu vou, mas não percebo para que é que queres o papel: tu não sabes ler!!!

- Leio de boca fechada!!!!